domingo, 16 de março de 2008

Novo Blogue

Um grupo de senhoras que frequenta a Oficina de Informática decidiu criar um blogue, dedicado a receitas de culinária.
Chama-se Colher de Pau.

quinta-feira, 6 de março de 2008

Poesia e Saias de Campo Maior

O salão da CURPI foi pequeno para acomodar todas as pessoas que quiseram assistir à sessão de Poesia e Saias de Campo Maior.
A apresentação esteve a cargo do Dr. Francisco Galego.

Um aspecto da assistência.

Outro aspecto da assistência.

Os três poetas que disseram poesias de sua autoria. Da esquerda para a direita, Sr. José Francisco Rúbio, Sr. Manuel Paio e D. Maria Lurdes Almeida.
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A primeira intervenção coube à D. Maria Lurdes Almeida. Na apresentação, o Dr. Francisco Galego caracterizou deste modo a sua poesia:

"Lurdes Almeida não será propriamente uma poetisa que possamos caracterizar como um exemplo de poesia popular.
Nos seus poemas encontramos um lirismo apaixonado pelas coisas da natureza, um sentimento romântico pelos afectos, uma sofrida mágoa e algum desencanto face aos desencontros e sobressaltos da vida.
Por muitas razões, trata-se de uma poesia que não pode ser considerada como popular, porque é muito pessoal, muito intimista e, formalmente muito elaborada.
Em grande parte dos seus poemas, constatamos que, Lurdes Almeida utiliza uma maneira ao mesmo tempo muito bela e muito pessoal de dialogar com o divino. Ou seja, por vezes, os seus poemas são, acima de tudo, uma maneira muito própria e íntima de rezar.
Mas é sem dúvida uma poesia onde as raízes populares ainda estão presentes. Sobretudo, quando, em quadras muito bem estruturadas, tanto no que respeita à rima, como na singeleza das palavras e das imagens que usa, através das quais expressa esse sentir dorido, apaixonado e encantado que, tanto o povo, como os poetas, têm perante a vida. Exemplifico com esta linda quadra extraída de um poema seu e que bem podia ser cantada em toada de “Saias”:
Deitei a pena a voar,
Pelo campo ao deus-dará;
Novo ninho há-de encontrar,
E a pena descansará."


D. Lurdes Almeida, durante a sua intervenção.

A D. Lurdes Almeida disse vários poemas, muito aplaudida pela assistência.
De seguida, foram apresentados os dois poetas autores de décimas:

"Diferentemente das “saias” que são versos para cantar, as décimas são versos de dizer. Estes versos, feitos para serem declamados, têm um ritmo e uma métrica próprios, caracterizando-se pelo encadeado dos versos em função do tema escolhido, definido pelo mote, elemento nuclear de cada poema.
Nestes poemas, umas vezes predomina a ironia, outras vezes, são mais descritivos tornando-se narrativas de factos extraordinários, expressando a maneira como o poeta popular explica a organização do mundo e a sua existência, tomando também, por vezes, a feição de crítica de costumes com uma intenção nitidamente moralista.
A estrutura formal é completamente diferente da das quadras de “saias”. Nas “décimas”, aparece primeiro uma quadra a que se chama mote, único elemento destes poemas em que existe alguma semelhança com as quadras do “cantar as saias”.
Seguem-se depois quatro estrofes de dez versos (“décimas”). Na sua forma mais perfeita, cada uma dessas estrofes acabará com o verso que, aparece pela mesma ordem na quadra de mote. Assim, o primeiro verso do mote é o último da primeira “décima”, o segundo verso do mote é o último verso da segunda décima, e assim sucessivamente, até que o último verso do mote terá de ser o último verso da última “décima”.
No mote a rima é do tipo a,b,c,b ou a,b,a,b. As “décimas” seguem o esquema a,b,b,a,a,c,c,d,d,c.

José Francisco Rúbio durante a sua intervenção

Mote
A mulher com quem eu casei,
Sempre viveu farta e cheia;
Mandava-a temperar a açorda,
Com as “cordalhas” da candeia.

I
Não via a cor ao dinheiro,
Com isso era estimada,
Muitas vezes era escovada,
C’uma escova de marmeleiro.
Isto é que é o verdadeiro,
Mentiras nunca as direi,
Uma saia lhe comprei,
Ao fim de casado dez anos.
Vendeu tripas aos milhanos,
A mulher com quem casei

II
Um ano matei-lhe um porquinho,
Que não pesava uma grama,
Para comer teve fama,
Ainda lhe sobrou toucinho.
Comia muita carne e bebia muito vinho,
Quando chegava em casa alheia,
Se pedia uma boa ceia,
Em recompensa dava-lhe um tombo,
De água nos olhos e lenha no lombo,
Sempre viveu farta e cheia.

III
Uma vez chamava-lhe filha,
Outra vezes era “canorsa”,
A cama era de palhoça,
Levantava-a com uma forquilha.
Como ninguém ela brilha,
Isso posso eu afirmar,
Fome nunca a deixei passar,
Mas sempre desviada da fartura,
Com a sombra da gordura,
Manda-a temperar o jantar.

IV
Era uma boa sujeita,
Disso posso eu dar sinais,
Do que via comer às mais,
Ficava ela satisfeita.
Era de barriga estreita,
Escassa como uma centopeia,
Não enchia tripa e meia,
Era uma louva-a-deus de gorda,
Mandava-lhe temperar a açorda,
Com as “cordalhas” da candeia.
( Declamado por: José Francisco Toureiro Rúbio)

Primeiro interveio o Sr. Manuel Paio e depois o Sr. José Francisco Rúbio.

Manuel Paio dizendo décimas


Seguiu-se a apresentação do cantar as Saias.

"As “saias”, como forma de cultura popular, expressavam o pensar e o sentir de comunidades que, ainda não há muito tempo, viviam em íntimo contacto com a natureza.
Até há cerca de meio século, a população do Alentejo, na sua grande maioria ligada aos trabalhos agrícolas, vivia em comunidades muito isoladas e muito autónomas. As dificuldades dos transportes, a ausência de estradas capazes e de outros meios de comunicação, o povoamento escasso e muito concentrado, constituíam factores que geravam o grande isolamento das povoações. Nestas condições, as tradições mantinham-se e propiciavam o desenvolvimento de formas próprias de comportamento colectivo.
No “cantar as saias”, com as suas ironias, os seus sarcasmos e as suas sentenças singelas, podemos encontrar a expressão da moralidade, da mundividência, das concepções religiosas, dos sentimentos de mágoa e de revolta ou dos afectos da gente simples que vivia nesses universos quase fechados que eram as cidades, vilas e aldeias alentejanas até à primeira metade do século XX.
As “saias” foram uma expressão cultural colectivamente criada e perpetuada por comunidades rurais. O acentuado carácter de produção colectiva não excluía, contudo, que as cantadeiras e os cantadores mais afamados, construíssem e conservassem o seu próprio repertório, ao qual iam acrescentando novas quadras criadas pelo engenho da sua inspiração.
O gosto popular foi esquecendo as menos apreciadas, ou porque eram vulgares, ou porque não eram perfeitas na sua construção. As outras, as que caíam fundo no gosto colectivo, eram repetidas até à exaustão e, assim, foram conservadas ao longo do tempo, passando de geração em geração. Ainda hoje, em Campo Maior, ouvimos cantar – nas arruadas dos grupos que se formam de modo mais ou menos espontâneo e nos bailes de roda que ocupam os cruzamentos de ruas – quadras que, com alguma surpresa, podemos encontrar em documentos escritos há mais de cem anos. Essas quadras constituem autênticas relíquias desta velha tradição. Muitas delas conservaram-se sem modificação da sua forma original. Outras foram sendo adaptadas às novas condições que se foram gerando na sociedade local.
Há quadras que se conservaram na mesma família atravessando sucessivas gerações de cantadores. Mas a inovação é constante como é próprio das manifestações de cultura popular que se mantêm vivas. E as “saias” são, em Campo Maior, tradição e vivência actual, ainda muito presente na vida desta comunidade alentejana.
Em Campo Maior poucos serão os que as conseguem cantar de forma notável. Mas, praticamente todos os campomaiorenses são capazes de as trautear. Elas fazem parte da sua cultura, pois cresceram a ouvi-las e, de forma natural, foram-nas memorizando. A maioria dos campomaiorenses sabe de cor, pelo menos algumas das quadras mais frequentemente cantadas. Aliás, esta situação foi bem retratada pelo inspirado canto de anónimos cantadores campomaiorenses, há mais de cem anos:
Isto do cantar é veia,
Que Deus deu às criaturas;
Quem não sabe tatareia, [1]
Com’os cegos às escuras.[2]"

[1] Tatareia - de tátaro, gago, que fala com dificuldade.
[2] Publicada em A Sentinella da Fronteira, nº 251, Elvas, 26 de Agosto de 1883, recolha de A. T. Pires."

As senhoras que cantaram as Saias, acompanhando o canto com pandeiretas e castanholas.

segunda-feira, 3 de março de 2008

Sessão de Março

Realiza-se no dia 5 de Março, às 17 horas, no salão da CURPI, uma sessão de POESIA E CANTO. Na primeira parte, intervirão os poetas campomaiorenses Maria Lurdes Almeida, José Francisco Rubio e Manuel Paio. Na segunda parte, actuará o grupo da Academia cantando Saias de Campo Maior.
A entrada é livre.